sexta-feira, 16 de julho de 2010

O Internato - Estágio I

O Verão que acaba...


Por mais que o som do meu iPod estivesse no volume máximo e o som de um rock pesado e agressivo quase preenchesse o vazio momentâneo do meu coração, não consegui deixar de escutar batidas ferozes à porta de meu quarto. Espreguicei-me vagarosamente na minha confortável cama. Não tinha a menor pressa em recebê-los...

Caminhei lentamente por entre a bagunça de (in)utilidades eletrônicas e papeis amassados. Quando enfim abro a porta retirando os fones do ouvido e bocejando, afinal são apenas 6hrs da manhã e quase não dormi na noite anterior, me deparo com um casal de estranhos me encarando de cara feia.


_Está atrasada. Começou o homem com severidade, ou seria relutância? Já se virando e indo em direção a escada.

_Já arrumou tudo? Perguntou a mulher, entreolhando por entre as brechas deixadas por mim e a porta, certamente a procura de minhas malas. Mal sabia ela que não precisei arrumá-las, já que nem cheguei a desfazê-las, semanas atrás...

_É claro... Respondi sem qualquer emoção, enquanto as buscava no closet. Sem me esquecer é claro de apanhar meu maior companheiro nos últimos verões. Encontrei o caderno, desgastado e com a capa toda rabiscada, jogado sobre a larga veneziana, ao lado de minha cama totalmente desarrumada. Dei um longo suspiro enquanto olhava uma última vez pela janela, me deleitando com a visão dos primeiros raios dourados que banhavam os mais altos edifícios a minha frente. Não havia, para mim, nada melhor do que morar naquela cobertura, em um dos mais luxuosos edifícios, na maior metrópole do país...

As vantagens eram simplesmente infinitas, como passar despercebida por entre as multidões, vestir e agir da maneira que lhe convir, e é claro a mais importante, ficar com quem e quantas quiser... Era realmente o paraíso para alguém tão perdida quanto eu... ou seria o inferno?

Deixa pra lá, nunca gostei de rótulos mesmo...

Diante dessas divagações, saltou-me a mente as lembranças deliciosas da última noite. Da qual desfrutei ao lado de uma linda oriental, o tipo de beleza e peculiaridade que você só encontraria numa grande metrópole, os centros das maiores biodiversidades humanas existentes... Ela havia me deixado esgotada, e eu, por minha vez eu a deixei sem qualquer esperança de um futuro reencontro, quando sorrateiramente a abandonei no fim da noite, na suíte de um luxuoso motel. Estava quase sorrindo dessas doces e tórridas recordações quando lembrei que não estava sozinha. Quando voltei a encarar a estranha a minha frente, ela parecia me indagar receosa com o olhar. Ela certamente adivinhava meus pensamentos mundanos...

_Podemos ir? Insistiu, já apanhando minha mala.

_Claro... Imediatamente recoloquei os fones de ouvido. Escutando rock de alta qualidade apanhei minha mochila mais a frente, e guardei dentro dela meu caderno. Quando me adiantei até a porta virei-me encarando novamente a estranha. _Vamos? Indaguei com ar impaciente.

A senhora faz uma cara de reprovação - com a qual me diverti mentalmente - enquanto passou por mim sem nada dizer. Nada como um dia normal em casa...

Chegamos ao aeroporto pontualmente às 7hs. O jatinho particular já estava pronto para decolar na pista à nossa frente, ele era mais um dos muitos bens dos quais a família Vasconcelos dispunha. Aliás, essa tal família, uma das mais ricas e prestigiadas do país e do mundo, era a minha “família”, entretanto eu apenas a via como um grupo de arrogantes e egoístas...

O tempo sutilmente cronometrado nos permitia apenas uma breve despedida.

_Esperamos revê-la no natal... Tentou inutilmente começar o homem que insistia que eu o chamasse de pai, como se de repente de uma hora para outra eu fosse fazê-lo. Ele era um tanto corpulento e já estava em processo de calvície bem adiantado, mas sempre estava elegantemente vestido em seu terno Armani exclusivo e seus sapatos de couro legítimos.

_Até breve, Samara... Acrescentou a jovial senhora a quem eu não podia ousar chamar de mãe, um pouco mais distante de nós, entre uma animada conversa ao celular. Ela era um protótipo do que o tempo e muitas plásticas podiam ocasionar em uma mulher vaidosa e extremamente rica.

_Até... Lancei um olhar indiferente a ela. Eu detestava aquele nome, digno de uma patricinha qualquer. Felizmente, só ela me chamava assim, para todos os outros eu era apenas Sam, ou para meu maior desgosto, “Srta. Vasconcelos”...

Já ao homem acanhado a minha frente, me restou lastimar sua continua falta de tato. Ele me abraçou desajeitadamente e eu pude fingi não ver seus olhos marejados, até por que, aquela cena era indiscutivelmente embaraçosa e deprimente para mim. Talvez até pudéssemos ter sidos bons amigos em outros tempos. Se aquilo não tivesse acontecido... Agora estamos para sempre fadados à isso... Recompus-me, mentalmente é claro, pois exteriormente não demonstrei qualquer emoção que fosse.

Mais um verão chegava ao fim... Pensei, entediada, enquanto, sentada confortavelmente olhava pela janela do jatinho, vendo a cidade diminuir e se afastar mais e mais, a cada segundo...



Continua...

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